sábado, 7 de junho de 2008

A AVÓ A CIDADE E O SEMÁFORO

Se não fosse aquele amável semáforo, o que seria dela?
Todos os dias, a avó se “aperaltava” por volta das 4 horas da tarde.
Calça azul escura, casaquinho com pele de coelho na gola, sapatos de salto baixo (que as pernas já não são o que eram…); pó-de-arroz na cara, rouge nas bochechinhas e um baton bem vermelhinho. Por detrás duns óculos de aros dourados, espreitavam uns olhinhos azuis muito vivos e brilhantes. Como remate uma boina verde descaída sobre a orelha direita.
Às cinco, as amigas esperavam por ela na “Brasileira”. Às cinco e meia, os dois netos saíam do colégio e passavam pela pastelaria para lhe dar um beijinho.
A casa da avó não ficava longe da “Brasileira”, mas o trânsito era tão intenso e os semáforos faziam-lhe muita confusão, sempre mudando de cor…
A sua sorte foi o tal, o simpático, o semáforo da sua rua…
Um dia, ela ia pôr o pé fora do passeio (distraída), quando ouviu um aflitivo: - “Psssst…Psssst…”! Olhou e, era o semáforo que falava com ela: -“Avó, não pode! Não vê que estou verde para os carros e vai ser atropelada?”
Ficou tão nervosa e atordoada que ele (o semáforo), até lhe deu uma pancadinha nas costas para a acalmar.
- Ó avó – disse ele – passe aqui o braço à minha volta e leve-me consigo!
A avó ainda ia começar a dizer que ele devia ser muito pesado mas, pasmada, verificou que o semáforo era leve como uma pena.
E lá foram!
Agora já não é espanto para ninguém. De há uns tempos para cá, nas ruas perto da "Brasileira”, há uma senhora já idosa, que por volta das 4 horas da tarde, atravessa calmamente e em segurança ruas e avenidas.
Pudera! Leva com ela um amável semáforo de luz vermelha permanentemente acesa.
Os carros param e os condutores com um sorriso de espantosa compreensão, fazem-lhe um amigável aceno.
E pronto! A avó lancha com as amigas, recebe um beijinho dos netos e mais tarde voltará para casa.
Encostado à cadeira do Fernando Pessoa, bocejando piscadelas intermitentes de luz amarela, lá está o semáforo à sua espera.
E por força do hábito, o Poeta, na sua cabeça de estátua vai versejando:

“Vomitando amarelos
Na mesa do meu café
Não é bicho nem é homem
Que diabo é que isto é???”

:) Feito com auxílio.

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